Processo foi motivado por reportagem sobre a chamada “Máfia dos Consignados”; justiça reconheceu que houve provas e que a liberdade de imprensa foi exercida de forma legítima
Foto: Reprodução/Redes Sociais
Em decisão proferida na segunda-feira (20), a juíza Evelin Campos Cerqueira Bueno, do Juizado Especial Cível da Comarca de Rio Branco, julgou improcedente a reclamação movida por Guilherme Alexandre Medici Aguiar Júnior e seus familiares — incluindo a esposa Rafaele — contra o jornalista Sebastião Maia Pereira, o Tião Maia.
A ação judicial foi motivada por reportagem publicada em agosto de 2024, no site AcreNews, assinada por Tião Maia, durante a campanha eleitoral. A matéria denunciava um esquema de fraudes conhecido como “Máfia dos Consignados” e citava familiares do então candidato a prefeito Marcus Alexandre (MDB), irmão e tio dos envolvidos. Os autores do processo alegaram que o conteúdo era ofensivo e motivado por fins políticos, pedindo indenização de R$ 10 mil para cada um dos quatro autores e retratação pública.
A reportagem, no entanto, teve grande repercussão, inclusive nacional, por ser publicada no mesmo dia em que se iniciava a propaganda eleitoral no rádio e na TV. Nela, o jornalista sustentava que, embora Marcus Alexandre não estivesse diretamente envolvido nas fraudes, ele teria tido conhecimento dos atos praticados por seus familiares e, ainda assim, permaneceu omisso, sem adotar qualquer providência.
Foto: Reprodução/Rdes Sociais – Marcos Alexandre ladeado pelo irmão (esquerda) e sobrinho.
A defesa do jornalista, feita pela advogada Ida Nunes, apresentou provas robustas: boletins de ocorrência registrados pelas vítimas dos empréstimos fraudulentos, documentos oficiais e testemunhos, inclusive do procurador-geral de Justiça do Acre, Danilo Lovisaro. Lovisaro confirmou, em depoimento, que demitiu Rafaele — esposa de Guilherme Júnior e advogada — de um cargo de confiança no Ministério Público do Estado do Acre (MPAC) em razão direta de seu envolvimento nos fatos relatados na reportagem. A acusação era de que ela usava a função para intimidar vítimas que buscavam acordos extrajudiciais.
A matéria também apontava que um dos empréstimos resultou na penhora de um imóvel do contador Francisco Silva, e que os recursos foram depositados na conta de Rafaele. Ela não conseguiu justificar a movimentação financeira nem a relação entre seu nome e o CPF do marido utilizados em diversas transações.
A juíza leiga Jéssika de Souza Alves Choi, que atuou no caso, afirmou que “o conteúdo da matéria jornalística veiculada pelo portal AcreNews, conquanto crítico e incisivo, se encontra amparado em elementos objetivos, como boletins de ocorrência e documentos de natureza oficial, referentes a investigações em curso”.
A decisão destaca que não houve extrapolação dos limites do direito à informação. “Trata-se de manifestação inserida no âmbito da liberdade de imprensa, que deve ser resguardada, inclusive como pilar do Estado Democrático de Direito”, escreveu a magistrada. A juíza reforçou que eventuais desconfortos causados por matérias jornalísticas sobre investigações ou denúncias não configuram, por si sós, violação à honra ou à imagem, “notadamente quando não demonstrado o dolo de caluniar, difamar ou injuriar”.
A ação também pedia a remoção da matéria e a retratação pública, mas como a reportagem já havia sido retirada do ar por decisão editorial do portal e o editor se retratou, esse ponto foi considerado sem objeto. A juíza julgou o processo extinto com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, e sem condenação em custas ou honorários.
A decisão foi homologada pela juíza togada Evelin Campos Cerqueira Bueno e ainda cabe recurso às instâncias superiores.
Ao comentar a decisão, Tião Maia afirmou:
“Isso mostra que ainda há Justiça no Acre e que todo cidadão deve confiar no Poder Judiciário. A liberdade de imprensa não foi apenas respeitada — a Justiça foi feita.”