Ministra Margareth Menezes defende na Unesco um ambiente digital mais justo e diverso

Cultura

Em um dia de intensa agenda na sede da Unesco, em Paris, a ministra da Cultura, Margareth Menezes, reafirmou nesta quarta-feira (18) o compromisso do país com a proteção e promoção da diversidade cultural no cenário global. O ponto alto de sua participação foi um discurso na abertura da 10ª Conferência das Partes da Convenção de 2005, onde defendeu a necessidade de adaptar as políticas culturais aos desafios da era digital e da Inteligência Artificial.

Liderando a delegação brasileira, ela apresentou a posição do Brasil, destacando o papel da cultura como uma força para a conscientização e mobilização por um mundo mais justo, em linha com a liderança do presidente Lula no combate às desigualdades.

Protocolo para o ambiente digital

Em sua fala, Menezes ressaltou que, 20 anos após a criação da Convenção sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, ainda há um longo caminho a percorrer, especialmente no que diz respeito à “estagnação da participação dos Países em Desenvolvimento no comércio global de bens e serviços culturais”.

O foco principal do discurso foi a urgência de uma atualização da Convenção para o século 21. A ministra defendeu a criação de um protocolo adicional focado no ambiente digital e na Inteligência Artificial. O objetivo, segundo ela, é proteger a diversidade cultural e linguística e garantir a “corresponsabilidade das plataformas digitais na promoção de práticas culturais transparentes, inclusivas e equitativas”.

Fortalecimento da diplomacia cultural

A agenda da ministra também foi marcada por importantes encontros bilaterais que reforçaram o posicionamento defendido no discurso. Margareth Menezes se reuniu com o diretor-geral adjunto de Cultura da Unesco, Ernesto Ottone, reforçando o diálogo entre o Brasil e a organização em torno do fortalecimento das políticas culturais, do enfrentamento aos novos desafios do ambiente digital e da relação entre cultura e mudanças climáticas.
Buscando fortalecer a diplomacia cultural, a Ministra também realizou reuniões estratégicas com Steven Guilbeault, ministro da Identidade e Cultura do Canadá, e com Mathieu Lacombe, ministro da Cultura e Comunicações de Quebec. Os encontros se concentraram na busca por soluções conjuntas para os desafios da preservação da diversidade cultural na era digital, um tema de interesse mútuo.

Brasil de volta ao centro do debate

A participação da Ministra foi fundamental para posicionar o Brasil como um ator central na agenda global da cultura, defendendo um sistema internacional mais equitativo e adaptado aos novos desafios tecnológicos. A missão da delegação brasileira em Paris continua, com a expectativa da eleição do Brasil para um assento no Comitê Intergovernamental da Convenção de 2005 para o quadriênio 2025-2029.

Veja na íntegra o discurso da ministra Margareth Menezes:

Excelentíssima Senhora Diretora-Geral da Unesco, Audrey Azulay,

Excelentíssimo Senhor Toussaint, Secretário da Convenção Unesco de 2005,

Excelentíssima embaixadora Paula Alves de Souza, Delegada Permanente do Brasil junto à Unesco,

Excelentíssimas Senhoras e Senhores Ministros da Cultura,

Prezadas Delegadas e Delegados,

É com especial emoção que me encontro hoje na Unesco, duas décadas após outro ministro da Cultura do Brasil — também artista e afro-brasileiro, como eu — ter tido a honra de liderar as discussões para a criação da Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais.

Não é coincidência estar aqui neste momento. Isso é reflexo do papel de liderança do presidente Lula, comprometido com o combate às desigualdades, com as pessoas mais vulneráveis, e que defende a cultura como uma força de conscientização, educação e mobilização em prol de um mundo mais justo e sustentável.

Ao longo de 20 anos, a Convenção já provocou transformações profundas no campo cultural, tanto em nível local quanto internacional. Esse avanço extraordinário confirma um dos principais objetivos da Convenção: despertar, em escala global, a consciência sobre a importância de proteger a diversidade cultural como um bem comum da humanidade e meio de promoção do desenvolvimento sustentável.

Prezados representantes,

Desde sua adoção, a Convenção tem orientado o Brasil na construção de políticas culturais inclusivas, democráticas e voltadas à diversidade.

Desde sua criação, em 2010, o Brasil tem sido um dos principais financiadores do Fundo Internacional para a Diversidade Cultural e atuamos ativamente no Comitê Intergovernamental.

Nossas políticas culturais impactam milhões de brasileiras e brasileiros, democratizando o acesso, valorizando a pluralidade e fortalecendo redes comunitárias em todas as regiões do país. Exemplos bem-sucedidos são a Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura e a Política
Nacional de Cultura Viva, que completa 20 anos desde que nasceu para cumprir as metas da Conferência, e assim nasceram os Pontos e Pontões de Cultura, na gestão do ministro Gilberto Gil.

Na economia criativa, estamos aprimorando as políticas para o setor, para que reflitam todo o seu potencial, já que responde por mais de 3% do PIB nacional. Estamos implementando uma nova Política Nacional para a Economia Criativa, fomentando a geração empregos, renda, inovação e inclusão social.

O acesso à cultura, em todas as suas dimensões, deve ser ampliado, criando condições para que todas as pessoas tenham acesso e participem ativamente da vida cultural de suas comunidades.

Senhoras e Senhores,

Passados estes 20 anos, percebemos que muito ainda está por ser feito.

Gostaria de destacar um ponto fundamental. Segundo a UNCTAD, a economia criativa é uma das áreas que mais cresce no mundo, representando até 7% do PIB dos países, empregando milhões de pessoas e transformando vidas.

No entanto, esse crescimento não se reflete nas trocas entre os países. Relatório do Secretariado da Unesco alerta que, desde 2017, a participação dos Países em Desenvolvimento no comércio de bens e serviços culturais está estagnada.

O grupo dos Países Menos Desenvolvidos responde por apenas 0,5% desse comércio global, enquanto os países desenvolvidos concentram 95%.

Esses números não podem ser ignorados. Não se trata apenas de corrigir desigualdades econômicas, mas sim de garantir o direito à diversidade cultural como pilar da democracia, do entendimento mútuo e da dignidade humana.

Essa desigualdade é também agravada no ambiente digital. A emergência da Inteligência Artificial generativa, por exemplo, levanta novos e profundos desafios para as indústrias criativas — sobretudo nos países em desenvolvimento, que ainda lutam por inserção nos circuitos globais.

Duas questões de especial relevância ainda têm o tratamento limitado na Convenção. A primeira é o reconhecimento da língua como parte indissociável da cultura. No ambiente digital, essa omissão pode levar à erosão de práticas culturais ligadas a idiomas não hegemônicos.

A segunda questão é a criação de um marco efetivo de diálogo com as plataformas digitais. É urgente que essas plataformas assumam corresponsabilidade na promoção de práticas culturais transparentes, inclusivas e equitativas — o que inclui a remuneração justa para criadores, a valorização de conteúdos locais e a mediação responsável de algoritmos.

Temos de agir de forma rápida, contundente e consciente, para garantir que todos os artistas sejam incluídos e participem do ambiente digital; que todas as línguas sejam contempladas e que a Inteligência Artificial seja uma ferramenta de potencialização da criatividade humana, e não o contrário.

Por isso, saudamos a proposta de criação de um Protocolo Adicional para fortalecer a implementação da Convenção no ambiente digital, garantindo transparência, acesso justo às tecnologias digitais e à Inteligência Artificial, e assegurando que comunidades subrepresentadas tenham suas vozes ouvidas e suas expressões protegidas.

Senhoras e Senhores,

Esta Conferência é o momento de renovar nosso pacto coletivo pela atualização e fortalecimento desta Convenção para as próximas gerações.

Seguiremos colaborando com os Estados Partes, a Unesco e a sociedade civil para fazer da cultura um bem público global, reforçando a diversidade das expressões culturais e reafirmando nossa humanidade.

Porque proteger a diversidade cultural hoje é garantir um futuro mais justo, mais plural e verdadeiramente humano.

Queridos amigos,

Me permitam deixar uma mensagem final a todos: enquanto algumas pessoas apostam em ideias bélicas, nós apontamos em ideias belas. Acreditamos na esperança, irmã da cultura. Existem outras saídas para os desafios globais, sem armas, onde prevalece o amor. E o amor nos humaniza e nos cura.

Desejo a todos uma excelente reunião.

Margareth Menezes

Ministra da Cultura do Brasil

18.06.2025 - 10ª Conferência das Partes da Convenção 2005, na sede da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco)

Fonte: Ministério da Cultura