O Ministério da Cultura (MinC) participou na terça-feira (8) de audiência pública na Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial da Câmara dos Deputados, para discutir a criminalização da cultura negra e periférica no Brasil.
O encontro foi solicitado pelos deputados Talíria Petrone e Reimont com o objetivo de discutir episódios recentes, como a ação policial durante festa junina no Morro Santo Amaro, na cidade do Rio de Janeiro, que resultou na morte de um jovem; e a prisão de MC Poze do Rodo.
A secretária de Articulação Federativa e Comitês de Cultura, Roberta Martins, representou o MinC no debate. Ela lembrou a importância de políticas públicas culturais efetivas para garantir fomento e proteção às manifestações artísticas nesses territórios.
“Esse caso do Morro Santo Amaro é desses episódios que fazem com que a gente traga à tona, com cada vez mais força, a posição de que políticas públicas são necessárias para superar o racismo institucional. Manter distância dessa pauta pode significar validar, implicitamente, a perigosa narrativa da criminalização dos territórios periféricos e, principalmente, da cultura e da vida das comunidades, vilas e favelas”, declarou a secretária, que participou de forma virtual da audiência.
E continuou: “Para nós, é preciso aumentar o papel institucional, essencial na defesa da diversidade cultural e artística do país, e apoiar abertamente a arte e cultura periféricas, e seus trabalhadores, que podem alterar a realidade social local, combater ciclos de violência e promover processos inclusivos sociais”, concluiu.
Cultura como ato de resistência
Diversos artistas de diferentes periferias do país foram convidados para participar. A MC Mac Julia, de Belo Horizonte, lembrou como o funk transformou a vida dela e dos familiares, defendendo que fazer cultura na favela é também uma forma de sobrevivência.
“O funk não gera dinheiro e condição de vida só pra mim, gera pro meu DJ, pros meus dançarinos, pra minha rede de apoio, pros meus familiares, para todo mundo que é da quebrada. A música salva. A música de periferia transforma. Eu virei empreendedora, abri minha loja, eu que produzo meus shows. Eu produzo cultura para o nosso povo. A gente precisa de respeito para fazer o que é nosso. A gente não está pedindo favor, a gente está pedindo investimento. Na periferia tem muitos talentos”, afirmou.
O presidente nacional da Nação Hip Hop, Fred Negro F, também participou da audiência e destacou que as iniciativas culturais e artísticas nas periferias fazem o papel que deveria ser do Estado.
“O Hip-Hop está lá, o funk está lá, a música está lá fazendo o que o Estado não faz, que é salvar a vida desses jovens negros periféricos. A gente faz o letramento, a gente conscientiza, é fato. Hoje, se eu estou na USP fazendo mestrado, é graças à cultura Hip-Hop. E é isso que eles temem. A cultura Hip-Hop pega essas pessoas e as projetam. Mas, querem matar as nossas lideranças, querem assassinar as nossas histórias”, declarou.
Ações legislativas
Para os deputados da Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial, a criminalização da cultura negra no país é um fenômeno histórico e estrutural, que se manifesta nas políticas de segurança pública e na atuação do Estado nos territórios periféricos.
O deputado Reimont lembrou outras manifestações culturais que também foram alvos de leis proibitivas na História do Brasil. “A criminalização da cultura negra nunca foi sobre segurança. Foi e ainda é uma desculpa para justificar o controle, o encarceramento e o extermínio de corpos pretos. Ontem foi o samba, hoje é o funk e em ambos os casos o que incomoda não é o som, mas a cor da pele de quem canta, dança e ocupa os espaços com alegria e identidade”.
Já Talíria Petrone encerrou a audiência pública lembrando que apesar de todas as dores, a cultura negra e periférica resiste. “A arte nos trouxe até aqui, e aqui estamos. E eles não estão dando conta de ter o sistema confrontado. Por isso, fé na festa, fé na cultura periférica, popular. Fé no povo preto. Fé na arte preta que nos trouxe até aqui. Vamos em frente!”.
Como um dos encaminhamentos, a Comissão vai mapear todos os projetos de lei que tramitam na Câmara dos Deputados que façam referência à cultura periférica e popular, para apoiar os textos de incentivo e fazer oposição às propostas proibitivas.
Fonte: Ministério da Cultura